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À maneira italiana

A beleza da deformidade
Por Prof. Átila Soares Filho - colunista sobre Artes
Madona com o Menino, São J.Batista e Madalena” de Parmigianino (Getty Museum, Los Angeles – PHOTO: Sotheby’s
Referindo-se a toda pedra preciosa de superfície irregular, a palavra “barroco” foi utilizada pela primeira vez no século XVIII, em Portugal nos estudos classicistas que classificaram as artes daquele período como “desordenadas”, “extravagantes” e “exageradas”. Após séries de intrigas e disputas palacianas, guerras, descobertas científicas, descobrimentos ultramarinos, a emergência burguesa e conflitos religiosos, esperava-se que a calmaria equilibrista e a rigidez espacial da Renascença cedessem lugar a um movimento de teor mais frenético e explosivo. Tais exageros tornam-se patentes quando falamos da arquitetura barroca. Majestoso e excepcional, o barroco, ao combinar de maneira inovadora elementos clássicos e renascentistas (colunas, arcos e capitéis) e adotar os efeitos curvos em proporções maiores, abriria espaço para que a escultura e a pintura optassem por essa nova forma de se planejar e proporcionar a maior sensação de magnitude e amplidão possível.

Seguindo na contramão da estética clássica, o Maneirismo italiano abre caminho para as demais manifestações que se tornariam modelo na construção da arte barroca. Esse movimento foi fundamental nas especulações sobre a ordem renascentista, sobretudo em representações da organização física do mundo e do universo. Seu mais expressivo representante naquele país foi Girolamo Francesco Maria Mazzola, o “Parmigianino” (1503-1540). Discípulo de Correggio, popularizou a água-forte na Itália e soube trabalhar com maestria o maneirismo italiano em suportes verticais. Parmigianino faleceu aos 37 anos de idade, em circunstâncias que, apesar de nebulosas, relacionam-se com práticas alquímicas. Sua “Madonna do pescoço comprido” é um dos quadros mais importantes da Pintura Universal pois, de pronto, esta nos surpreende pelos exageros e distorções das formas da Virgem - que, antes, seria a deusa Vênus – e do Menino Jesus em seu colo. Em tese, a figura do Salvador representa o máximo da sacralidade no mundo cristão, pois é (homem e) Deus e, por conseguinte, imporia uma inviolabilidade no seu tratar. Naquele contexto histórico-social, a Renascença já havia conseguido trazer o divino ao mundo dos mortais e, quando deixava de ser natural, a figura humana seguia uma espécie de anatomia matemática. Ali, todos os seres - incluindo os celestiais - buscavam um sentido de ordem espacial (algo emanado diretamente pela consciência divina). Parmigianino, assim, dava um salto para além dessa compreensão: o elemento antropomórfico (homens comuns, além de Cristo, a Virgem, os santos e os anjos) seria deformado; ou melhor, visto pela ótica física das superfícies convexas e/ou côncavas (vide o autorretrato do pintor no Museu de História e Arte de Viena). Talvez seja por essa razão que Parmigianino é tão celebrado pelos quadrinistas e demais artistas europeus. Inclusive, este maneirismo impregna nossa cultura pop. Um exemplo é a reformulação do Homem-Aranha pelo celebrado desenhista canadense Todd McFarlane, desde os anos 80: de acordo com essa nova formatação, o personagem passa a se apresentar totalmente inumano - ou seria, a exemplo de Cristo, dos santos e dos anjos, um “supra-humano”? Agora, ele é “bestial”, como uma aranha, contorcido em poses e piruetas forçada e elegantemente idealizadas. A arte deste canadense foi capaz de renovar drasticamente o interesse e lançou as vendas do herói da Marvel às alturas.

Mal interpretada como “artificialismo”, no entanto, a ideia era trazer um novo realismo que privilegiaria todas as possibilidades do olho humano e suas “armadilhas” - uma grande novidade nas artes ocidentais pós-Antiguidade. Ora, talvez esta aventura chamada “Vida” - assim como as “deformidades” de Mazzola - só façam sentido na pluralidade de possibilidades, dependendo de qual filtro de visão percebamos o sentido desta experiência.

Referências.
____________________. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte e crítica de arte. Lisboa: Estampa, 1988.
ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte Italiana. São Paulo: Cosac & Naify, 2003.
BERENSON, Bernard. Le Caravagge. Paris: Presses Universitaires de France, 1959.
CARAMELLA, Elaine. História da arte: fundamentos semióticos. Bauru: USC, 1998.

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